domingo, março 04, 2007

Wood, woodpecker



James Wood leu Against the Day. É sintomático do seu modus operandi que a crítica tenha sido, entre os principais periódicos americanos, a última a aparecer.
A peça é longa e ponderada; revela a habitual atenção à linguagem, e a escolha precisa de citações (que é, ou deve ser, a principal ferramenta do crítico); e é enfaticamente negativa, o que só surpreende quem não tem acompanhado a carreira de Wood.
Se a minha nova e divertidíssima entidade patronal me conceder o tempo necessário, tentarei esta semana explicar porque continuo a considerar James Wood o arquétipo do leitor ideal, apesar das ocasionais imbecilidades que pontuam o texto sobre Pynchon. Tentarei explicar porque é que o seu recente e desconcertante hábito de bicar artefactos de plástico ou cimento como se fossem de madeira não obsta a que continue a ver nele o herdeiro espiritual de V. S. Pritchett, e o melhor crítico literário contemporâneo. E tentarei explicar porque é que faria questão em lhe apertar a mão caso o encontrasse na rua, independentemente da sua vontade em ter a mão apertada.
Esclareço ainda, a propósito desta ambígua graçola, que partilho a opinião de Clive James: não creio que a crítica literária seja essencial à literatura; mas creio que ambas são essenciais à Civilização. A Era de Ouro pode ter acabado, e sacerdotes estéticos como Eliot ou Leavis podem ser irrepetíveis, mas acho que a crítica literária actual está bem e recomenda-se, particularmente a de pendor não-académico (a que prefiro), e anglófona (a que conheço melhor). Para além de James Wood, destaco Louis Menand (da New Yorker), John Leonard (Harper's e The Nation), Daniel Mendelsohn (NYRB), e também três escritores talvez mais conhecidos como ficcionistas, mas cujos ensaios me parecem indiscutivelmente superiores aos seus desiguais romances: Martin Amis, John Updike e Cynthia Ozick.
Nestas mãos atentas e carinhosas, a Crítica Literária poderá sempre aconchegar-se despreocupadamente; a sua saúde não corre perigo.

16 comentários:

  1. Anónimo01:22

    não li o artigo, nem sequer li o teu post, mas vi o pica-pau e decidi comentar não sei porquê: amanhã leio o post e o artigo. Espero que esta imbecilidade explique alguma coisa.

    ResponderEliminar
  2. Anónimo01:43

    Confesso que também não li o teu comentário até ao fim, e no entanto aqui estou a responder.
    Se isto pega, pode ser o fim da civilização ocidental.

    ResponderEliminar
  3. Anónimo11:07

    o Wood contradiz-se: primeiro diz que "broadly speaking" uma das correntes do romance provém de Fielding - mas mais adiante diz que Fielding não teve influência na novela europeia.

    ResponderEliminar
  4. Anónimo11:50

    Não se contradiz nesse ponto. A tentativa de ancorar o Romance moderno na justaposição dos estilos de Richardson e Fielding (o foco na personagem vs. o foco no evento) não é de Wood, nem é recente. Remonta pelo menos a 1957, e ao "The Rise of the Novel" de Ian Watt. Wood limita-se a acrescentar que a segunda tradição - a do romance picaresco - não teve descendência significativa entre os escritores continentais. Mas reconhece a "enorme influência" que viria a ter no romance inglês, e posteriormente no americano.
    Agora deixem-me trabalhar, que eu sou um homem que trabalha.

    ResponderEliminar
  5. Anónimo12:07

    Uma enorme influência parece-me uma descendência significativa. Mas enfim, quem trabalha é que manda.

    ResponderEliminar
  6. Anónimo12:30

    "Europeu" é jargão britânico para "continental". E isso até está claro no texto. A influência é enorme no romance inglês, e é irrisória no romance continental. Onde é que está a contradição?

    Se isto é uma artimanha para eu ser despedido, aviso já que não tem graça nenhuma.

    ResponderEliminar
  7. Anónimo12:43

    Por acaso há uma certa linha do romance russo que tem um lado picaresco, como muitos contos de Gogol e até o franciú do Maupassant. Mas enfim, não era um estilo propriamente dito.

    Mas acima de tudo há que concluir uma coisa: só trabalha quem não sabe fazer mais nada.

    ResponderEliminar
  8. Anónimo12:54

    "This is doubtless a rough division", como ele reconhece no texto.
    E nada de insultar quem trabalha. Senão obrigas-me a pousar o daiquiri, a tirar as sandálias e os óculos escuros, e a chatear-me a sério.

    ResponderEliminar
  9. Anónimo14:22

    ok ok, prontos: estou a ver que tenho mesmo que ler o sacana do ensaio ;)

    ResponderEliminar
  10. wood - madeira
    pecker - pilinha, pila, piça, mangueira, catana, sei lá agora n me tou a lembrar dakeles diminutivos para caralho msm castiças mas vcs sabem, como os desenhos animadus foram sempre feitos pelos gajus mais keimados.


    www.motoratasdemarte.blogspot.com

    ResponderEliminar
  11. Anónimo16:52

    "catana" é novidade para mim, mas registo com agrado a expansão do léxico comum aos instrumentos de exploração e conquista de novos territórios.

    ResponderEliminar
  12. Anónimo03:30

    Olha, anda aqui um gajo a tentar aproximar-se da vertente sistémica da epistemologia pós-moderna do comentário semi-referencial no plano da abducção (i.e, no plano semi-semântico do todo que se rejeita e não se define nem preenche como objecto, mas que apenas se projecta no todo cultural como uma maquete simbólica do não que é possível como representação) e depara-se com escatologias e análises etnográficas contráditórias em-si e o camandro. Rogério, tens que por uma mão VIGOROSA nisto.

    ResponderEliminar
  13. Anónimo03:41

    bem, eu disse VIGOROSA mas estava com o Caps Lock ligado. Não queria ser tão efusivo. Olha, seja como for: um abraço rapaz. Adeus, tenho que me ir embora: vou estudar violoncelo, intervalos, reduções na tablatura de quinta, harmónicos suspendidos e, no mesmo plano, a evolução gráfica dos meio-tons numa espinha transformada para 3 oitavas e cenas do género. Acho que está na altura de me dedicar ao silêncio. Um grande abraço.

    ResponderEliminar
  14. Anónimo03:52

    Estive para fazer uma análise profunda das transformações societárias no plano da nova dimensionalidade da aquisição do quotidiano verbático-funcional (o LOL, por exemplo) mas depois achei que o Pacheco Pereira vai falar nisso eu não sou um projecta-cornambelhos e por isso calei-me. Bom. Só queria dizer adeus como cavalheiro e não-só e fazer corresponder o motivo deste post com o post de cima, que é coisa que ainda não fizeste: i.e. mandar bocas de um post para o outro numa perspectiva de não tanto auto-referencialidade do post mas interdataregisto na afectação dos símbolos, que são expansíveis. Isso é que é de homem. Ûm Abraço.

    ResponderEliminar
  15. Anónimo04:03

    o violoncelo é f*****. As escalas são do caraças e é necessário trabalhar muito. Não fosse o tutor (95% das tipas que ensinam violoncelo são giras) era um instrumento a esquecer.

    ResponderEliminar
  16. Anónimo00:29

    Bonito, sim senhora! Com coragem, o meu caso real: conheci uma gaja que depois da piada masculina respondia «LOL». Achei piada, pois claro, e passei a noite toda a contar-lhe piadas apenas para ouvir o «LOL» verbal. Aparte: Foi a última vez que estive realmente motivado para contar piadas.

    (era meu intuito inserir aqui uma citação do Bomba Inteligente, mas não consegui. Lamento.)

    ResponderEliminar