terça-feira, agosto 18, 2009

Que fazer? (as questões palpitantes do nosso movimento)

Bom dia. É uma da tarde. Creio estar a cingir-me aos factos quando digo que é terça-feira. Estou prestes a deitar-me. Escrevo estas linhas na cidade de L. no ano de 20__ enquanto saboreio gressinos torinesi besuntados com maionese do Lidl. Estão 25 graus, e o gentil leitor enverga significativamente mais cuecas do que eu. Não pego no livro do Pynchon há dez horas e meia, embora, no mesmo período de tempo, tenha lido na íntegra os quarenta e sete textos linkados ontem pelo Bookforum. A não ser que o conhecimento de uma estrada em Malta que liga Zebbug e Mdina me venha um dia a safar de uma situação delicada com, hipoteticamente, ciganos, não me lembro de ter aprendido nada de relevante. O meu esquentador faz um barulho esquisito, mas é provável que ele pense o mesmo de mim. Já emigrei por muito menos. Faltam pouco mais de seis horas para o Sporting entrar em campo contra a Fiorentina, uma equipa italiana da classe média-alta. Ao longo da sua história, várias equipas do Sporting, em diferentes e variadíssimos estados de consciência, foram tranquilamente eliminados de provas onde não deviam ter entrado por equipas italianas da classe média-alta, imunes ao desenvolvimento político das forças produtivas. Esta eliminatória não vai ser excepção. Não vejo qualquer hipótese de a Fiorentina não conseguir vencer o Sporting. Na verdade, a única hipótese de o Sporting não perder esta eliminatória de uma forma catastrófica seria artilhar uma exibição de tão confrangedora incompetência que a Fiorentina se sinta embaraçada por estar a praticar aquilo que é, essencialmente, a mesma modalidade desportiva, e se torne transigente, permissiva, decadente, antes de nos fazer o mesmo que o Mr. Miyagi faz ao Kreese no princípio de Karate Kid II: apertar-nos o nariz em amável galhofa, em vez de nos transferir o septo para o hipotálamo, pagando a respectiva cláusula de rescisão.
E contudo, há pessoas felizes. Alguns amigos e conhecidos sportinguistas, nem todos psicopatas, apresentam um transtornante optimismo nas suas esporádicas interacções comigo. Não percebo. Alguns falam de tácticas, mas também não percebo. Vi o Nacional-Sporting do primeiro ao último minuto e não percebi. Passei os primeiros minutos a tentar identificar o sistema táctico utilizado pelo Sporting (na companhia de pelo menos cinco dos jogadores titulares). O Bruno Sena Martins ("Paulo Bento ensaiou uma alteração táctica de molde a converter o losango (4-4-2) num 4-2-3-1.") quer convencer o país de que percebeu tudo, mas eu tenho as minhas dúvidas. Aceito aquele '4' inicial, mas rejeito enfaticamente todos os algarismos subsequentes. Eu não sei o que se passou em campo no Sábado à noite e duvido que alguém saiba. O sistema táctico do Sporting 2009/2010 é mais instável do que um mapa interactivo da Polónia. O cosmos deu uma volta tão grande que o enredo de um livro do Pynchon é mais fácil de seguir do que o sistema táctico do Sporting. Isto é particularmente doloroso para mim. Desde pequenino que consigo identificar o mais dedáleo sistema táctico em dois minutos de televisionamento. Desta vez, ao fim de vinte minutos tive de ir buscar papel e lápis. A última vez que tinha ido buscar papel e lápis foi em 1994, ao ver a selecção da Bulgária no Mundial dos Estados Unidos. Qualquer conversa de losangos e triângulos nesta fase dos acontecimentos é um insulto, não apenas a Euclides e Hipócrates de Quíos, como a mim e à minha pobre mãe, que está cheia de saudades minhas.
O que é o que o Miguel Veloso tentou fazer na primeira parte do jogo? Ninguém sabe. Qualquer pessoa que diga que sabe está a mentir. O Miguel Veloso por quem me apaixonei na sua estreia contra o Inter em 2006 tinha a missão de receber a bola à frente da defesa, rodopiar duas vezes para cada lado, e depois telegrafar a bola a uma pessoa com um projecto de vida sensivelmente parecido com o seu. O Miguel Veloso de Sábado estava, nas palavras de um optimista comentador da TSF, "descaído sobre a meia-esquerda", encarando cada lance que se desenrolava à sua volta com a mesma perplexidade com que Hamlet encarava o fantasma do pai. Sem um jogador à frente da defesa que possa interromper a potencialmente infinita troca de bola entre os dois centrais mais nervosos da história do futebol, a chamemos-lhe "construção de jogo" do Sporting passa agora por Abel - o mesmo Abel que consegue receber a bola a cinco metros da linha de meio-campo, e sem um único adversário num raio de dez, com a mesma serenidade de um guarda-redes a receber um atraso com os pés pressionado pelo Romário. Algures mais lá para a frente, o João Moutinho que se parece cada vez menos com o João Moutinho e cada vez mais com o Bob Geldof em 1985, anda de um lado para o outro a tentar furiosamente alimentar a África inteira com duas barras de nougat. O Djaló, que numa encarnação anterior deve ter chegado de avião à Fantasy Island e pedido ao Ricardo Montalban para ser extremo-direito, recebe a bola com a canela junto à linha lateral, simula uma breve lesão osteocondral em frente ao lateral contrário, corre três metros para a frente e efectua um passe em profundidade para um dos jogadores prestes a fazer exercícios de aquecimento. O Postiga, cuja missão em campo me parece agora consistir em recuperar a bola quando o Sporting tem a bola, e manter a bola quando o Sporting não tem a bola, passou grande parte do jogo a pressionar adversários imaginários perto de uma bandeirola de canto imaginária. O Rochemback. O Rochemback continua a ser um excelente futebolista e gostaria que a SAD efectuasse um esforço financeiro no sentido de comprar o seu passe a Satanás. Gosto muito muito do André Marques, que tem duas das qualidades essenciais num lateral moderno: quando a bola é cruzada da faixa oposta consegue não sofrer um súbito aneurisma cerebral; e quando tem a bola aos seus pés esforça-se activamente por endossá-la a alguém que apresente notórias semelhanças físicas com um colega de equipa. O Daniel Carriço também me agrada muito. Assumo que tenha recebido a rigorosa educação que a Academia reserva para os defesas-centrais. Os defesas-centrais de um clube grande, dizem os docentes, passam 75% do jogo sem nada para fazer, portanto a sua virtude essencial deve ser a concentração. Infelizmente, depois de uma época a titular, a concentração é a única qualidade do Daniel Carriço impossível de avaliar. O Daniel Carriço passa o jogo inteiro a acudir a emergências, e deve chegar ao final dos noventa minutos numa pilha de nervos, com vontade de ir percorrer a estrada entre Zebbug e Mdina à procura de uma prostituta para assassinar. A minha vida, basicamente, acabou. Mas quero que sejam felizes quando eu já cá não estiver, porque a existência é uma dádiva e não devemos desperdiçá-la.

9 comentários:

cdc disse...

Sr. Casanova não emigre, nem muito menos morra! Este post era um testamento perfeito mas não morra ou eu vou logo a seguir.

rui disse...

Como me dizia agora no mesenger um amigo que praticamente só fala por chalaças, "há a miséria franciscana,mas agora temos a miséria beneditina". "mto ppoupadinhos, mto coitadinhos, sempre à espera da caridade alheia (auto-golos)
".
O que vale, acrescento eu, é que os italianos, no máximo dos máximos, param ao 2º golo. Se não ainda saía um massacre à Bayern.

Anónimo disse...

ahahahahahahaha

O Postiga, cuja missão em campo me parece agora consistir em recuperar a bola quando o Sporting tem a bola, e manter a bola quando o Sporting não tem a bola, passou grande parte do jogo a pressionar adversários imaginários perto de uma bandeirola de canto imaginária...

não posso ler estes posts no trabalho, sou precário

ps. este post não devia ter escrito na Dieta Rochemback?

rui disse...

"O futebol da técnica, jogado com muita classe! "

No anúncio do site da RTP ao jogo de logo...

Anónimo disse...

Tanta preocupação desnecessária face à superlativa eficácia de ganhar jogos 1-1 sem marcar sequer um único golo.

jaa disse...

Não sei se reparou (ainda não percebi muito bem em que é que repara e em que é que não repara) mas o Luís Naves do Corta-Fitas recomendou o Pastoral Portuguesa como sendo um "excelente blog pós-moderno". Deve ter lido estes dois últimos posts.

Anónimo disse...

你家中有老年人需要短長期照顧嬤!!!居家看護半天12小時1300元起。

醫院看護1天24小時1800元起,半天12小時1200元起。歡迎參觀指教喔~打擾了!!!

看護 看護 看護

居家看護 居家看護 居家看護

看護中心 看護中心 看護中心

醫院看護 醫院看護 醫院看護

João Gaspar disse...

ainda hoje não percebo muito bem em que posição jogava o ivanov.

Anónimo disse...

Taiwan's flooding caused by the disaster, let us love to play together to help those in need of help, and now you need to do is click on any one keyword for each link will be sponsored by the NT one dollar, let us work together to create world peace ~ thank you!

台灣這次受到洪水侵襲造成巨大災難,讓我們發揮愛心一起幫助這些需要幫助的人,現在你只要每點擊任何一個關鍵字連結,將會得到新台幣一元的贊助,讓我們一起共同創造世界和平~感謝您!

旅遊 法拍屋 服飾
婦產科 大陸外籍新娘 新娘
納豆保健食品 瑜珈教室
彌月蛋糕 汽車旅館MOTEL 台中住宿
清潔公司 法拍屋 看護
隔熱紙 seo 網路行銷
整形外科 看護 整形
室內設計 系統傢俱 網頁設計
柴犬 哈士奇 網頁設計
防爆工具 瑜珈 機票