terça-feira, outubro 24, 2006

Madrugada avulsa

Há seis anos que sou leitor regular de jornais britânicos e, neste período, apenas por quatro vezes exerci um dos mais aprazíveis direitos que essa condição proporciona: o puxar da indignação e escrever uma carta ao editor. Estreei-me nas vésperas do Euro 2004, com uma vociferante reprimenda a um jornalista desportivo do The Guardian, corrigindo um artigo seu onde uma declaração de Luís Felipe Scolari fora espectacularmente mal traduzida. Na segunda, para a secção de livros do Independent, protestei contra o elitismo bonacheirão que detectei numa apreciação a Philip K. Dick, e que considerei (deve ter sido antes do pequeno-almoço) uma gravíssima falta de respeito. A terceira foi para o The Scotsman, a propósito da Lei anti-tabagista. A quarta foi para o The Scotsman, a propósito da Lei anti-tabagista. O que aconteceu foi isto: apercebi-me de uma falha descomunal no meu primeiro argumento e, sob pseudónimo, escrevi nova carta a desmantelar a missiva original. Devidamente desmantelado, o argumento morreu, sem ninguém ter ligado pevide a mim ou a mim.
(O incidente, já agora, veio-me à memória porque acabei de jogar uma partida de xadrês contra mim próprio, na qual fui sumariamente derrotado; posso não ser o meu mais temível adversário, mas sou certamente o meu mais temível adversário).
Serve este preâmbulo para justificar a minha relutância em usar o blog para opinar sobre matérias "correntes". Não há qualquer alínea nos estatutos do "Pastoral Portuguesa" que me proíba de falar em referendos, manifestações e outros temas de interesse público. O receio de incorrer em polémicas estéreis e prolongadas com terceiros também é quase nulo. O que me apavora é a possibilidade de dar voz a um ponto de vista tão objeccionável que me impeça de voltar a olhar para mim próprio da mesma maneira.
A propósito, no dia 24 de Outubro de 1966, morria em Moscovo (de diabetes) a matemática russa Sofya Yanovskaya. Foi ela quem persuadiu Wittgenstein e Francis Skinner a abandonarem a sua curta aventura Soviética em 1935.
Não sei que extenso novelo Histórico esta singela acção terá desenrolado, mas de uma coisa estou certo: tenho sono e não consigo pregar olho. Não há quem me receite uma mezinha?

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