A minha tendência natural para levar imediatamente o dedo ao gatilho sempre que ouço ou leio algum comentário, por mais pertinente e racional que seja, sobre a necessidade de haver certos limites na comédia, é algo de que não me orgulho, e que tenho vindo a tentar refrear com a ajuda de bastantes iogurtes naturais. A prova de um relativo sucesso terá sido uma ocasião recente, em que, evidenciando notável tolerância, decidi não partir uma única secção óssea do corpo de um conterrâneo de Jonathan Swift que afirmou à minha frente, e de uma forma muito séria, que a Sarah Silverman era uma cripto-fascista que merecia ser presa. A Sarah Silverman, esclareço, é alguém em quem não descortino um valor por aí além, com quem me rio apenas esporadicamente, e por quem nunca passarei noites na prisão. Mas há princípios com os quais não se brinca, até porque os iogurtes não são infalíveis.
(Para que as minhas caixas de comentários não comecem a ficar para trás em matéria de epítetos à queima-roupa, quero aqui relembrar que cada vez gosto mais do blogue do Luis Miguel Oliveira.
Há duas maneiras de ver isto. Uma é pensar que houve uma pessoa que conduziu um automóvel alcoolizada, colocando potencialmente em risco a integridade física de terceiros. Que foi posta sob liberdade condicional e que violou prontamente essas ditas condições. Que poucas horas antes de ter de se apresentar na cadeia para cumprir pena, e num clima noticioso totalmente dominado por esse facto, decide assistir ao vivo a uma cerimónia da MTV apresentada por uma comediante notoriamente avessa a piadinhas sobre amendoins ou "airline food", perante uma plateia constituída por pessoas que não me parecem estar a dar largas a nenhuma orgia de "moralismo sexual" ou "let's-all-laugh-at-the-rich-girl" (embora concorde com quase tudo o que o Bruno diz, custa-me ver a teoria do «momento de justiça/vingança (a ética do trabalho junta-se a algum moralismo sexual)» imputada a uma plateia que inclui Jack "orgy" Nicholson e Rogério "serially unemployed" Casanova).
Esta maneira de ver a coisa permite-me pensar que me ri daquilo sem grande desconforto porque aquilo tem piada (os fantasmas passíveis de análise sociológica também são um factor, mas não assumem maior ou menor relevância do que em todas as outras coisas a que eu acho piada, nomeadamente cartoons sobre ovelhas, vídeos com gatinhos, entrevistas do Norman Mailer, ou a Zita Seabra). No dia em que os comediantes começarem a dilatar o critério (que até considero válido) da «permeabilidade/fragilidade de quem é visado» para que este exclua a possibilidade de ser um bocadinho mauzinho para a Paris Hilton numa entrega de prémios da MTfuckingV, será, convenhamos, o dia em que a Via Láctea começará discretamente a cair aos bocados.
A outra maneira de ver as coisas é encarar tudo aquilo como "um nojo", "desumano" e "repugnante", posição adoptada por duas pessoas na caixa de comentários do Avatares (que também inclui o clássico gâmbito da "inveja, as pessoas que riem têm é inveja"). O que me põe a pensar, entre colheradas frenéticas de Adagio Simbiótico: que vocabulário é que restará a esta gente para descrever aquelas coisas - que nunca se passam em cima de um palco - e que são efectivamente "um nojo", "desumanas" ou "repugnantes"?
Esta maneira de ver a coisa permite-me pensar que me ri daquilo sem grande desconforto porque aquilo tem piada (os fantasmas passíveis de análise sociológica também são um factor, mas não assumem maior ou menor relevância do que em todas as outras coisas a que eu acho piada, nomeadamente cartoons sobre ovelhas, vídeos com gatinhos, entrevistas do Norman Mailer, ou a Zita Seabra). No dia em que os comediantes começarem a dilatar o critério (que até considero válido) da «permeabilidade/fragilidade de quem é visado» para que este exclua a possibilidade de ser um bocadinho mauzinho para a Paris Hilton numa entrega de prémios da MTfuckingV, será, convenhamos, o dia em que a Via Láctea começará discretamente a cair aos bocados.
A outra maneira de ver as coisas é encarar tudo aquilo como "um nojo", "desumano" e "repugnante", posição adoptada por duas pessoas na caixa de comentários do Avatares (que também inclui o clássico gâmbito da "inveja, as pessoas que riem têm é inveja"). O que me põe a pensar, entre colheradas frenéticas de Adagio Simbiótico: que vocabulário é que restará a esta gente para descrever aquelas coisas - que nunca se passam em cima de um palco - e que são efectivamente "um nojo", "desumanas" ou "repugnantes"?
(Para que as minhas caixas de comentários não comecem a ficar para trás em matéria de epítetos à queima-roupa, quero aqui relembrar que cada vez gosto mais do blogue do Luis Miguel Oliveira.
E num assunto à parte, alertar para a manchete mais incorrecta de todos os tempos, que se podia ler hoje, até há poucas horas atrás, na edição online d' A Bola: "Tudo certo com Peseiro". Meus senhores: com Peseiro, nunca esteve, nem nunca estará "tudo certo".)
33 comentários:
Caro Rogério, a piada é bem esgalhada. A ser censurada seria por ser demasiado óbvia e um pouco leve. Para ter realmente piada devia ter ido mais longe.
Um abraço,
Tiago.
Calma, vou pôr o comentário no avatares. Os teus leitores são uns porcos (conheço um).
Um abraço,
Tiago.
Tiago: também não era preciso ofender, pá.
Aquilo não tem piada. Aquelas piadas da Sarah Silverman, aquelas em particular, são boçais e só resultam porque existe um ódio prévio a Paris Hilton. Além disso, aquilo é uma humilhação em directo, parece o regresso ao pior espírito do liceu americano. As piadas podiam dizer o mesmo ou insinuar o mesmo, mas mais classe. Sacha Baron Cohen, com o Borat, conseguiu fazer muito melhor, mesmo com o público bronco dos MTV awards porque tem autoparódia permanente pela sua personagem patusca. Neste clip em particular, da Sarah, não há autoparódia. E isso faz toda a diferença acho eu :\
Ai aquilo não tem piada? Pronto, isso assim tão bem explicadinho já é outra conversa.
Mas sendo eu uma pessoa paciente, tolerante, e recentemente guarnecida de muitos Yoplaits com pedaços, venho só aqui mandar esta hipótese para a merda do ar: a mim, que tenho obviamente padrões cómicos boçais, e um enormíssimo ódio prévio a Paris Hilton, a imagem das grades da prisão pintadas cor-de-pénis fez-me rir. E porque sou muito claramente um gajo horrível, recheado de ressentimentos, e porque tresando a moralismo sexual, também não consegui achar espaço suficiente no meu coração para ter pena da rapariga, porque a outra rapariga no palco foi mazinha para ela, coitadinha.
(Quanto ao resto, acho que essa do "espírito do liceu AMERICANO" é muito bem metida, senão aqui as pessoas poderiam pensar que o espírito do liceu NÃO-AMERICANO era o mesmo, quando todos sabemos que não, que o espírito de “humilhação em directo” está todo do lado de lá. Aliás, basta ir a um liceu em Londres, Paris ou na Cova da Piedade para ver um recreio cheio de alunos de laço e cartola, trocando anedotas do António Sala.)
Há uma tradição na comédia com muitos e muitos anos que se chama "roasting". Há "roasts" organizados, feitos com a conivência do visado, e na presença dos seus amigos, e há “roasts” improvisados, em que uma pessoa com muito más noções de relações públicas é trazida de volta ao planeta. O que Stephen Colbert fez ao Presidente Bush no Correspondent’s Dinner também foi boçal? Também foi mauzinho? Ou aqui o problema é mesmo a menina Silverman não ter “classe” para fazer o mesmo sem usar a palavra “pénis”, que fica tão feia na boca de uma menina?
Pode-se chamar àquilo "humilhação pública" se quisermos. Podemos usar as palavras “boçal” e “ódio” muitas vezes seguidas.
Também podemos chamar-lhe “comédia”, conceito que explicarei aqui detalhadamente um dia, com mais tempo e mais iogurte.
Confesso que não percebo qual é o problema com a piada.
Eu achei graça.
Não se costuma dizer que cada um se deita na cama que faz? A Paris devia pensar nisso. Se é que não está farta de saber isso, mas enfim...
Fica mal uma menina usar a palavra? Fica.
Mas no contexto de graçola não tem outra cor? Tem.
Conclusão: Nem só as grades podem ser pintadas...
Casanova,
Não tem qualquer comparação a piada do Stephen Colbert pelo básico e evidente motivo de que o visado era o Presidente. O que tem piada num caso desses, independentemente da qualidade da piada, é o facto de se zombar de alguém tão poderoso, é isso que funciona, e quanto mais directa e boçal for a piada mais ridiculariza o visado. Mas para rir da Paris Hilton seria preciso um pouco mais, bastante mais até, dada a falta de atributos humorísticos dela, ou seja, não basta expô-la ao ridículo para fazer rir, é preciso que a piada tenha alguma imaginação. Neste caso a piada é básica, imberbe, confunde-se mais com um insulto e os insultos também fazem rir, portanto, sim uma piadinha em tom de insulto, pronto, concedo, fique lá com o seu humorzinho de trazer por casa.
O problema com a piada é que dick jokes não ficam muito bem no repertório de uma mulher comediante, independentemente de ser de mau gosto ou não gozar com uma pessoa que vai passar uns diasitos na prisa - com a atenuante de que terá tratamento especial. A piada é má porque é fácil demais, e aquela gente ri-se muito porque é oh tão permeável a piadas más, especialmente se for para bota abaixo de um deles.
tiago: és capaz de ter razão.
rogério: cuidado com o simbiótico. em nenhuma parte se diz que é um iogurte (http://linha-dos-nodos.blogspot.com/2006/07/hilaritico-o-adagio-simbitico-ateno-em.html) ...
Claro que isso do liceu americano é irrelante, assisti a muitos "achincalhamentos" na minha própria escolha, disse americano porque isso aconteceu nos EUA. Nunca se achincalham os fortes, só os fracos e naquela sala, Paris Hilton é a fraca. É uma outsider. O que Stephen Colbert fez não tem qualquer tipo de comparação. Gozou com o "highschool king of the prom" no seu próprio território. Bush teve um evidente fairplay que lhe ficou bem, é a reabilitação que refere o Rogério. Paris Hilton pareceu-me humilhada e a partir daí perde a graça para mim. Eu sou daquelas pessoas um bocado a puxar para o sentimental e sensívelzinho, tem razão. Faziam impressão ao meu coraçãozinho de beata as figuras de Anna Nichole Smith ou da Courtney Love nos MTV Awards. Mas é o sistema, o grande sistema triturador precisa destas peixeiras e elas fazem fila para o serem. Se tiverem dinheiro e boca para o broche chegam lá de certeza. A única coisa digna que resta é o suícidio que foi o que Anna Nichole Smith fez. Acabaram-se as piadas e começaram os documentários dramáticos, a outra face da mistificação mediática, o culto da morte. Longe de mim defender limites Rogério. Aquilo não tem piada, e pensei ser escusado acrescentar o "para mim". A propósito, o All music Guide dá 4/5 estrelas ao album da Paris Hilton. Também dá que pensar.
Wow... afinal foram 4 estrelas e meia pelo insuspeito crítico de referência Stephen Thomas Erlewine O_o
Paris, Review by Stephen Thomas Erlewine.
O que o Colbert fez ao Presidente Bush teve graça por vários motivos, mas o principal não foi a qualidade do texto (não foi dos melhores momentos da equipa Colbert, e a própria delivery foi esporadicamente gaguejante), nem a posição privilegiada do alvo (fazer piadas sobre o Presidente Bush é um desporto planetário que não precisa de um grão de “coragem”, não me venham com conversas).
O motivo principal, quanto a mim, foi este: não apenas o Presidente Bush, mas também uma carrada de assessores e subordinados acharam que convidar o Colbert para fazer aquilo era uma boa ideia. Não é, como diz o João, o facto de o Presidente Bush ser "poderoso", até porque esta Administração tratou de escancarar o dique (peço perdão pela “dique-joke”) a uma enxurrada de "zombaria dos poderosos", e educou uma geração inteira a rir-se tão prontamente do Presidente dos Estados Unidos como de uma socialite. Não é por aí.
Da mesma maneira, o que é muito engraçado é o facto de a Paris Hilton - e inevitavelmente um batalhão de conselheiros - ter achado uma boa ideia ir a uma cerimónia da MTV apresentada pela Silverman, numa altura em que os noticiários do país não falavam noutra coisa que não o seu encarceramento iminente.
Os conselheiros de Bush acharam que o Presidente iria mostrar publicamente o seu fairplay perante um comediante com visibilidade, proveniente de uma escola (a da Comedy Central) com inquestionáveis credenciais anti-Bush. Os conselheiros de Paris acharam possivelmente que a Sarah Silverman iria fazer referências inofensivas à aspereza dos lençóis na prisão e deixar a coisa por aí
Tiros que retrocederam dolorosamente pelas respectivas culatras. Isto é engraçado, pelo menos para mim, que gosto de humorzinho de trazer por casa, e me contento com muito pouco.
E atenção que o "evidente fairplay" mostrado pelo Bush era uma noção a priori, era apenas a estratégia planeada. Porque a reacção real patente no seu rosto nessa noite foi muito parecida com a de Paris anteontem: ambos estavam nitidamente a pensar "why the hell did no one warn me about this?"
Se vocês não acham graça a isto, ou distinguem mesmo as duas situações com base no cargo político que um ocupa e a outra não, então são melhores pessoas que eu, pronto.
P.S: David, eu sou fã de Pynchon e da anedota da “bola de golfe amarela”: para mim, nenhuma piada é demasiado fácil. Mas tenho de ver isso dos iogurtes. Não me agrada nada a ideia de ser vítima da indústria do fermento.
E Lourenço, olha que a faixa 11 (a versão do Rod Stewart) é melhor que o original. Estou aqui a bater o pé à conta dela, enquanto escrevo esta vergonha.
Meus caros, isso da humilhação nos liceus americanos tem a mesma lógica do Nuno Gomes a ponta de lança. Dos 4 aos 16 fui humilhado, roubado, achincalhado, apalpado, quase diariamente, em 4 escolas diferentes, todas elas cá no burgo.
Já agora, limites no humor? Quem não se rir com este vídeo* que atire o primeiro calhau. Ou será o contrário?
Um abraço,
Tiago.
*http://www.youtube.com/watch?v=Fy_UCHTuCCs
Ok, admito que vi isto descontextualizado e por esse prisma faz sentido. Mas acho que subtil diferença entre uma e outra situção (Bush e Paris) é o meio onde ambos estão quando levam a bujarda... As pessoas à volta de Bush não se puseram a aplaudir (a própria Sarah goza com a reacção histérica da sala à notícia que Paris vai ser presa). Acho que essa cena mais faz diferença. Paris está habituada a todo o tipo de humilhação e ganha muito com isso. E "fazer piadas sobre o Presidente Bush é um desporto planetário". Mas há sempre uma espécie de filtro mediático ou temporal que separa as pessoas que riem, do alvo da risota, especialmente quando não há autoparódia. Acho que se o público estivesse calado ou incomodado na piada da Sarah Silverman (como sucedeu com Bush) eu próprio teria achado mais piada. Ok, acho que foi isso. Se quem sofresse as consequências da piada fosse Sarah, isso teria piada. Tipo o Kaufman a levar porrada nos shows de wrestling ou Borat, num rodeo no texas, a ser perigosamente vaiado ao cantar o hino do cazaquistão.
Quando Borat abre os MTV Awards depois da Madonna com "It was very courageous of MTV to start the show with a genuine transvestite, he was very convincing e continua com coisas como "Please prepare yourself for masturbation because next are international singing prostitutes, Pussy Cat Dolls" ou (vestido de Freddy Mercury a ver-se a genitalia) Hello it is me, Freddy Mercury. I joking, he die of AIDS. It me Borat, I not a la la loo lee. instala-se uma espécie de silêncio no pavilhão atlântico, um desconforto entre aquela plebe mtv. E isso tem mais piada. Mesmo assim, Sacha Baron Cohen (em minha opinião o maior génio do humor actual) levou porrada de todos lados. O Nuno Galopin fez uma crítica daquelas dos tais "limites do humor". Eu só acho que uma coisa pode ter ou não piada. Estou traumatizado. No meu primeiro ano em Lisboa vivi 6 meses numa casa com uma família que via os malucos do riso ao jantar e ria histericamente sempre que um actor fazia O_o no fim dos sketches.
tlpg eu também. O meu pai era professor de matemática na minha escola. Eu participava nas olimíadas da matemática. Uma vez, estava a falar com a V. (de quem gostava) e veio o R. por trás e baixou-me as calças de fato treino e os boxers, fiquei nú em frente à turma e à V. Toda gente riu muito. Uma vez, numa sala de aula, começaram a dizer que eu gostava da M. e todos a rir a rir a rir e eu desatei a chorar. Calou-se tudo. Tinha praí 13 ou 14 anos.
Os meus filmes preferidos são o Elephant e o Carrie.
«O meu pai era professor de matemática na minha escola... Os meus filmes preferidos são o Elephant e o Carrie»
Este gajo agrada-me.
O que é que estás a querer dizer? Que és mais traumatizado do que eu? Ninguém é mais traumatizado do que eu. Meu caro, uma vez, em Lisboa, depois de uma aula de educação física, um cigano roubou-me as calças de fato de treino e tive ir em cuecas para casa. Portanto, mais respeitinho se faz favor.
Um abraço,
Tiago.
Para mim também não deve haver limites para uma boa piada. Mas esta piada não é boa. Nem sequer funciona como elemento de incomodidade.
Tenho um amigo que tem um amigo que tem um amigo que viu um filme video com a Paris Hilton fora da prisão e bastante solta, aliás. A Sarah Silverman vem apenas, com o seu textinho, ampliar as imagens desse vídeo que até já não tinha grande resolução no tamanho original. Uma má ideia.
Concordo com o Bruno do Avatares quando diz que «saber que Paris Hilton é uma ricaça mimada, que nunca fez nada na vida, dada a exibicionismos sexuais e outros, confere à plateia um momento de justiça/vingança (a ética do trabalho junta-se a algum moralismo sexual)». Isto apesar da ressalva feita aqui neste blogue, chamando à atenção para certos elementos da plateia, a saber: «Jack "orgy" Nicholson e Rogério "serially unemployed" Casanova». Ri-me mais com esta piada do que com a outra. Sou um homem simples.
Ok Tiago. Essa é puxada. É a primeira vez que confesso isto em público mas a ocasião merece... *inspira*... trabalhei 7 ou 8 dias nas vindimas para ter dinheiro para merda de um fato escuro para ir ao baile de gala da minha cidade de província, daqueles da pequena burguesia saloia, os putos fumam os charutos, as miúdas estudam francês na alliance française etc.
E porquê? A Vania (nome fictício) convidou-me. Eu gostava dela, era miss popular da escola, a Paris Hilton da merda do liceu, dormia com qualquer gajo que tivesse uma DT50 e preservativos. Eu era o melhor amigo dela. Eu não dormia com ela. Não tinha uma DT50 e muito menos preservativos. Ok, tinha preservativos. Isso tinha. Tive os mesmos durante 5 anos. Eu ajudava-a, eu passava-lhe os meus exames, eu aturava a choradeira e as queixas dos maus tratos dos namorados, da dor da penetração etc. Sei é que ia com ela, era o rei da festa. Mas uma vez lá trocou-me logo pelo bodyboarder mais cromo do sítio. E eu fiquei sozinho enquanto eles curtiam na pista de dança ao som do Great Pretender tocado por uma banda de covers manhosa. Ok, nem era o Great Pretender. Nem sequer era o Great Pretender, era praí o Dont Cry dos Guns N'Roses. Sabes o que é ouvir don't cry tonight, I still love you baby e sentires que aquilo foi escrito para ti e que o único gajo que gosta de ti é o Axl Rose? Eu digo-te: é mau. Eu saí do baile a meio, fui pelas ruas àquela hora e toda gente olhava para mim, de fato escuro, a vir do baile, sozinho, riam-se todos nas minhas costas. Cheguei a casa e a minha mãe "já?" e bati com a porta do quarto. No outro dia toda a escola falava nisso. O meu pai chega-se ao jantar e diz "epá, lá na escola dizem que tu és um totó com as miúdas, que elas fazem de ti o que querem". Como é que isto chega aos ouvidos de um professor de matemática é algo que ainda hoje me ultrapassa. Mas é assim. É por isso que depois um gajo estuda, cresce, sai de casa, vem para cidade, conhece miúdas que ouvem Pavement e Morphine, escreve, engata miúdas um bocado mais interessantes com o tempo, e acaba por ser o rei, o rei do liceu Portugal mmmUAaahahahahAHh *olhar psicótico*
sinto-me melhor. obrigado.
Caro RC,
Estou momentaneamente retirado da blogosfera, mas espanta-me que um tipo como tu, tão cuidadoso com os detalhes, defenda uma piada que é tecnicamente péssima. Bem sei que isto que vou dizer passa um pouco à margem da discussão, mas partir do princípio que a felação implica uma mordidela é estar a desinformar os teus leitores menos experientes, induzindo neles uma espécie de fear conditioning por antecipação que os conduzirá à frustração sexual. Essa Silverman não passa de uma feminista encapotada, perdoa-me a conclusão algo apressada e que talvez implicassse uma deambulação prévia pelos estereótipos sexuais de dominação masculina. Infelizmente, preciso de trabalhar.
Essa Silverman não passa de uma feminista encapotada (condição 200% incompatível com a produção de uma boa piada): acho que agora se chegou ao cerne da questão e podemos todos ir para casa comer adágios simbióticos.
Ó Anónimo, eu se calhar devia ter começado esta merda por dizer o seguinte: «Eu gostava de gostar mais da Sarah Silverman do que gosto. Era mais fácil. Eu gostava que a piada fosse tecnicamente mais defensável do que é. Era mais fácil.» Mas penso ter deixado bem claro que há aqui duas ou três questões de princípio que são mais importantes do que o valor da piada em si. A saber:
- Que não é preciso ter "ódios prévios" ou "moralismos sexuais" para rir daquilo. Basta apenas ser apanhado a jeito para ver na imagem das barras de prisão cor-de-pénis uma inesperada surrealidade que, no momento, funciona. Gostava, se me dão licença, de poder ficar aqui sentadinho a rir durante 4.3 segundos (estimativa) de uma piada que não é perfeita sem ser prontamente incluído numa demographic feita à pressão a ter o seu "momentozinho de vingança" por sei lá o quê;
- Que a Paris Hilton e a sua entourage cometeram um monumental erro estratégico ao acharem que a Silverman não iria tão longe nem tão baixo, e que esse facto, por si só, num dia chato, destes da Margem Sul, é suficiente para eu me rir durante 2.7 segundos (estimativa).
- Que uma piada, sendo melhor ou pior, sendo insultuosa ou não, nunca deve andar para aí a ser descrita como "um nojo", "desumana" ou "repugnante" sem eu primeiro ter acumulado um lote substancial de iogurtes genuínos.
E é isto.
"A felação é um fenómeno de todos os tempos e sempre habitou o lado mais negro da espécie humana"
Santana Castilho, PÚBLICO, 06-06-2007
mas partir do princípio que a felação implica uma mordidela é estar a desinformar os teus leitores menos experientes
Era esse o meu alvo. A minha experiência diz-me que é possível alguém partir um ou mais dentes durante a "felação", isto sem implicar uma "mordidela". Se se recriar mentalmente a imagem de um acto felativo(?), verifica-se nitidamente que tenho razão (e os dentes frontais imaculados). Obrigado.
v,
Creio que entramos numa discussão demasiado técnica para surtir efeito na ausência de suporte gráfico (ou modelização).
rc,
Certíssimo quanto aos pontos 1 e 3. Sobre o ponto 2: é abusivo falar-se em erro de estratégia da parte do team Hilton. A moça anda há anos a aumentar a sua fortuna jogando desta forma.
As graças devem ser indiferentes a quem as profere. Devem, até, ser julgadas levemente indignas, um fardo a transportar: afinal são um assunto do «visado» que interpela inopinadamenre o «humorista» em forma de "oh pst pst". «E que tenho eu a ver com isto?» é a forma adequada de lidar com a coisa, com esse acotevelar. No caso, a tal Silverman parecia feliz, feliz como se lhe tivessem dado um yogurte de bónus ou tivessem dito «muito bem, é assim mesmo» e essa obstinação no efeito, como a da felicidade estraga qualquer tentativa de. Paris Hilton - alguém que conhece a monotonia - estava absorta, o sorriso e o ar educada e levemente incomodados foram amabilidade, de circunstância, mero tique de gente com mundo.
«Sabes o que é ouvir don't cry tonight, I still love you baby e sentires que aquilo foi escrito para ti e que o único gajo que gosta de ti é o Axl Rose?» Excelente.
Ainda assim, ontem almocei com a gaja que me pôs os cornos e o actual namorado com quem ela me pôs os cornos, enquanto se apalpavam debaixo da mesa, mesmo à minha frente. I rest my case.
Um abraço,
Tiago.
O_o *silencio e tensão na sala*
*alguém tosse*
A única coisa que conheço de Sarah Silverman é aquilo que por cá vai chegando via youtube, e confesso que embora lhe acho piada, não tem nada de genial. Adorei este momento, acho que ele se tornou delicioso e tão apetecível por a visada da piada estar presente e pela forma como esta reagiu, mais do que por ser um grande momento de humor inteligente. A piada até é bastante básica. E como dizia o Nuno Markl, aquele sorriso de Jack Nicholoson também acrescenta interesse a isto.
Quanto aos limites na comédia, a meu ver, é bom que não existam, para bem do humor.
Chegou o Zé do Telhado e foi toda a gente embora. Mau.
os comentários que uma brochista inspira...
...parece-me que os def lepard teriam um efeito muito mais devastador, já para não falar nos foreigner ou assim, digo eu sem a completa certeza, mas substituindo o anterior citado por um gajo coxo...
ui...os limites...
O_o
eu diria que no género pedante e maria-vai-com-as-outras o LMO é o melhor.
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