Com excepção da segunda parte do França-Uruguai (que perdi devido a complicações de cariz étnico causadas pela presença no recinto de trinta e cinco ingleses bêbados [muitos dos quais vestidos de batman] numa despedida de solteiro), consegui assistir a todos os eventos do Certame até agora. Foram seiscentos e setenta e cinco minutos de futebol, pontuados por aquele zunido colectivo, grave, desconcertante e ininterrupto, que qualquer adepto já se habituou a reconhecer: a wall of sound produzida por milhões de milhares de mulheres a fazerem perguntas sobre as regras do jogo.
Ligeiramente abaixo na escala decibélica, o ruído constante das vuvuzelas também se tem apresentado em grande forma, mostrando resistência, intensidade e disciplina táctica, embora as suas hipóteses de conquistar o título de ruído permanente mais irritante da competição estejam agora ameaçadas pelo ruído permanente de pessoas a queixarem-se sobre o ruído permanente das vuvuzelas; o duelo promete ser renhido até à final.
Transferindo as nossas atenções para assuntos mais importantes - o sucesso das minhas démarches para dissipar antecipadamente o reembolso do IRS em apostas idiotas - posso confirmar que está tudo bem encaminhado. Vinte libras numa vitória da África do Sul, mais vinte num golo do Higuaín contra a Nigéria já se encontram aconchegadas nos cofres da William Hill, embora outras vinte apostadas na possibilidade de a Alemanha atingir a final ainda possam ser convertidas em duzentas e oitenta. Gosto imenso desta selecção alemã: não só tem o melhor médio do mundo naquele estilo de letargia frenética aperfeiçoado por Pablo Aimar (Ozil), como também tem as melhores credenciais multinacionais da prova: dois turcos, um tunisino, um ganês, um bósnio, um brasileiro, e três polacos. Ainda não há um judeu, mas é uma questão de tempo.
O Gana assustou-me imenso: técnica, táctica e atleticamente, foi sempre 10% superior (chegou) a uma Sérvia que continuo a acreditar ter uma das melhores defesas do mundo, mas que foi severamente penalizada pela traiçoeira independência de Montenegro, que os privou de poderem convocar o Vucinic. A Eslovénia foi a equipa mais fraca até agora, pelo que evidentemente está no primeiro lugar do seu grupo, com três pontos. A Argentina confirmou ter o grupo de jogadores ofensivos mais entusiasmante, pelo que evidentemente ganhou 1-0, com o único golo a ser marcado por um ex-defesa do Sporting.
Quando a destaques individuais, a grande revelação do torneio tem sido o comentador da Sport TV Luis Martins, cujas rápidas desmarcações semânticas e movimentos de ruptura com a língua portuguesa têm proporcionado instantes de rara beleza. O seu lance mais genial até agora terá surgido na descrição de uma tabela transviada entre dois jogadores argentinos: "Tevez ali a direccionar-se de forma contraproducente em relação à bola".
Uma última e exultante nota para a auto-estima inglesa, que voltou a direccionar-se de forma contraproducente em relação à História, sofrendo uma das suas humilhações rituais, desta vez aos pés de uma selecção americana que deu toda as indicações de ter sido treinada especificamente para este momento desde a batalha de Saratoga. Para interpretar o sempre ingrato papel de General Burgoyne e colocar simultaneamente a "situação Eduardo" em salutar perspectiva, foi escolhido Robert Green, um de múltiplos Ricardos à disposição de Fabio Capello - há mais dois no banco, para o caso de Green começar a exibir sinais de lapsos de concentração nos seus lapsos de concentração.
7 comentários:
devias escrever o relato dos jogos em directo como fazem no record. ninguém te oferece um iPad?
Ó homem, não demore tanto tempo a regressar de novo à blogosfera.
O manager argentino teve momentos de aquecimentos constantes(fez minis sprints e uma corridita mais morosa),queria ir para o campo, entao o messi nao marcava, o homen estava que nem podia.
Voltou mesmo!
crónica hilária; só uma correcçãozinha, creio que o marcador do golo argentino é um ex defesa do beira mar; e uma pérola do rui santos da sic, "enfim, mais uma solução da FIFA que não veio resolver nada"; obrigado pelas gargalhadas proporcionadas
Tens a certeza que o Podolski não é judeu? É que foi isso que me venderam. Só não concordo com uma coisa: o título de melhor comentador vai para o João Querido Manha, que viu o Toldo a ser substituído ao intervalo. Está parecido com o Buffon, o gajo, mas o JQM diz que era o Toldo. Não questiono. E para mim a surpresa do Mundial foi o Brasil sofrer um golo do jogador mais barato no FIFA Fantasy Football. Uma bofetada de luva branca no Dunga...
Caro Rogério, nessa lista de estrangeiros alemães (soa estranho mas bonito, não é verdade?) ainda falta o espanho Mário Gómez e o nigeriano Dennis Aogo. E não esquecer que o Marin é bósnio/sérvio, ou seja, podia escolher entre três selecções.
Já agora, o Kroos, com aquele "o" duplo, cheira-me que tem antecedentes holandeses.
Enviar um comentário