James Wood leu Against the Day. É sintomático do seu modus operandi que a crítica tenha sido, entre os principais periódicos americanos, a última a aparecer.
A peça é longa e ponderada; revela a habitual atenção à linguagem, e a escolha precisa de citações (que é, ou deve ser, a principal ferramenta do crítico); e é enfaticamente negativa, o que só surpreende quem não tem acompanhado a carreira de Wood.
Se a minha nova e divertidíssima entidade patronal me conceder o tempo necessário, tentarei esta semana explicar porque continuo a considerar James Wood o arquétipo do leitor ideal, apesar das ocasionais imbecilidades que pontuam o texto sobre Pynchon. Tentarei explicar porque é que o seu recente e desconcertante hábito de bicar artefactos de plástico ou cimento como se fossem de madeira não obsta a que continue a ver nele o herdeiro espiritual de V. S. Pritchett, e o melhor crítico literário contemporâneo. E tentarei explicar porque é que faria questão em lhe apertar a mão caso o encontrasse na rua, independentemente da sua vontade em ter a mão apertada.
Esclareço ainda, a propósito desta ambígua graçola, que partilho a opinião de Clive James: não creio que a crítica literária seja essencial à literatura; mas creio que ambas são essenciais à Civilização. A Era de Ouro pode ter acabado, e sacerdotes estéticos como Eliot ou Leavis podem ser irrepetíveis, mas acho que a crítica literária actual está bem e recomenda-se, particularmente a de pendor não-académico (a que prefiro), e anglófona (a que conheço melhor). Para além de James Wood, destaco Louis Menand (da New Yorker), John Leonard (Harper's e The Nation), Daniel Mendelsohn (NYRB), e também três escritores talvez mais conhecidos como ficcionistas, mas cujos ensaios me parecem indiscutivelmente superiores aos seus desiguais romances: Martin Amis, John Updike e Cynthia Ozick.
Nestas mãos atentas e carinhosas, a Crítica Literária poderá sempre aconchegar-se despreocupadamente; a sua saúde não corre perigo.
16 comentários:
não li o artigo, nem sequer li o teu post, mas vi o pica-pau e decidi comentar não sei porquê: amanhã leio o post e o artigo. Espero que esta imbecilidade explique alguma coisa.
Confesso que também não li o teu comentário até ao fim, e no entanto aqui estou a responder.
Se isto pega, pode ser o fim da civilização ocidental.
o Wood contradiz-se: primeiro diz que "broadly speaking" uma das correntes do romance provém de Fielding - mas mais adiante diz que Fielding não teve influência na novela europeia.
Não se contradiz nesse ponto. A tentativa de ancorar o Romance moderno na justaposição dos estilos de Richardson e Fielding (o foco na personagem vs. o foco no evento) não é de Wood, nem é recente. Remonta pelo menos a 1957, e ao "The Rise of the Novel" de Ian Watt. Wood limita-se a acrescentar que a segunda tradição - a do romance picaresco - não teve descendência significativa entre os escritores continentais. Mas reconhece a "enorme influência" que viria a ter no romance inglês, e posteriormente no americano.
Agora deixem-me trabalhar, que eu sou um homem que trabalha.
Uma enorme influência parece-me uma descendência significativa. Mas enfim, quem trabalha é que manda.
"Europeu" é jargão britânico para "continental". E isso até está claro no texto. A influência é enorme no romance inglês, e é irrisória no romance continental. Onde é que está a contradição?
Se isto é uma artimanha para eu ser despedido, aviso já que não tem graça nenhuma.
Por acaso há uma certa linha do romance russo que tem um lado picaresco, como muitos contos de Gogol e até o franciú do Maupassant. Mas enfim, não era um estilo propriamente dito.
Mas acima de tudo há que concluir uma coisa: só trabalha quem não sabe fazer mais nada.
"This is doubtless a rough division", como ele reconhece no texto.
E nada de insultar quem trabalha. Senão obrigas-me a pousar o daiquiri, a tirar as sandálias e os óculos escuros, e a chatear-me a sério.
ok ok, prontos: estou a ver que tenho mesmo que ler o sacana do ensaio ;)
wood - madeira
pecker - pilinha, pila, piça, mangueira, catana, sei lá agora n me tou a lembrar dakeles diminutivos para caralho msm castiças mas vcs sabem, como os desenhos animadus foram sempre feitos pelos gajus mais keimados.
www.motoratasdemarte.blogspot.com
"catana" é novidade para mim, mas registo com agrado a expansão do léxico comum aos instrumentos de exploração e conquista de novos territórios.
Olha, anda aqui um gajo a tentar aproximar-se da vertente sistémica da epistemologia pós-moderna do comentário semi-referencial no plano da abducção (i.e, no plano semi-semântico do todo que se rejeita e não se define nem preenche como objecto, mas que apenas se projecta no todo cultural como uma maquete simbólica do não que é possível como representação) e depara-se com escatologias e análises etnográficas contráditórias em-si e o camandro. Rogério, tens que por uma mão VIGOROSA nisto.
bem, eu disse VIGOROSA mas estava com o Caps Lock ligado. Não queria ser tão efusivo. Olha, seja como for: um abraço rapaz. Adeus, tenho que me ir embora: vou estudar violoncelo, intervalos, reduções na tablatura de quinta, harmónicos suspendidos e, no mesmo plano, a evolução gráfica dos meio-tons numa espinha transformada para 3 oitavas e cenas do género. Acho que está na altura de me dedicar ao silêncio. Um grande abraço.
Estive para fazer uma análise profunda das transformações societárias no plano da nova dimensionalidade da aquisição do quotidiano verbático-funcional (o LOL, por exemplo) mas depois achei que o Pacheco Pereira vai falar nisso eu não sou um projecta-cornambelhos e por isso calei-me. Bom. Só queria dizer adeus como cavalheiro e não-só e fazer corresponder o motivo deste post com o post de cima, que é coisa que ainda não fizeste: i.e. mandar bocas de um post para o outro numa perspectiva de não tanto auto-referencialidade do post mas interdataregisto na afectação dos símbolos, que são expansíveis. Isso é que é de homem. Ûm Abraço.
o violoncelo é f*****. As escalas são do caraças e é necessário trabalhar muito. Não fosse o tutor (95% das tipas que ensinam violoncelo são giras) era um instrumento a esquecer.
Bonito, sim senhora! Com coragem, o meu caso real: conheci uma gaja que depois da piada masculina respondia «LOL». Achei piada, pois claro, e passei a noite toda a contar-lhe piadas apenas para ouvir o «LOL» verbal. Aparte: Foi a última vez que estive realmente motivado para contar piadas.
(era meu intuito inserir aqui uma citação do Bomba Inteligente, mas não consegui. Lamento.)
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