sábado, setembro 30, 2006

Comadres

O mundo literário também é pródigo em confusões, mas começo a acreditar que os anos de ouro já lá vão. Onde estão os sucessores de Norman Mailer, que passou décadas gloriosas a esfaquear esposas e a pregar valentes cabeçadas a Gore Vidal em festas novaiorquinas?
No The Guardian de hoje, Salman Rushdie (na minha lista negra desde o ridículo Fury) reagiu publicamente pela primeira vez a uma crítica mordaz que John Updike fizera ao seu (igualmente ridículo) Shalimar the Clown, nas páginas da New Yorker. A peça em questão abria com uma pergunta retórica: "Why oh why did Salman Rushdie in his new novel call one of his characters Maximilian Ophuls?", nome que deixa implícita uma referência ao homónimo realizador alemão que o resto do livro não desvenda. Descuido? Prestidigitação?
A resposta de Rushdie: "A name is just a name. 'Why oh why?...' Well, why not? Somewhere in Las Vegas there's probably a male prostitute called 'John Updike'."
Até nem é má, a resposta. Mas - ladies, is that the best you can do? Alguém lhes dê dois tacos de baseball, se faz favor.

"Forget it, Vladimir. It's Reykjavik"


O sempre cordial mundo do xadrês competitivo voltou a desaguar numa caldeirada de mau sangue. 24 anos depois do "Cameragate" em Reiquiavique, temos agora o "Toiletgate" de Kalmykia.
Devo dizer, contudo, que o meu coração pende para Kramnik. E que atire a primeira pedra aquele que não pensaria duas vezes antes de aceitar partilhar uma retrete com Topalov.

Desabafo

Permitam-me que partilhe o seguinte desabafo: o cavalinho Fairmile, treinado pelo normalmente fiável WR Swinburn, sofreu hoje a humilhação de terminar a das 15:45 em Newmarket num escandaloso 18º lugar, ele que era um claro favorito.
Duas consequências imediatas desta calamidade:
1. esta noite não vou jantar fora;
2. quem for, terá provavelmente a oportunidade de comer um bife retirado ao dorso do cavalinho Fairmile.

Self-Made Man

Regresso

Está tudo na mesma.

quinta-feira, setembro 28, 2006

O resto do Mundo


Em Bruxelas, à luz do Sol, dois estranhos apontam o dedo à multidão.

terça-feira, setembro 26, 2006

Bruxelas

Não é, de todo, semelhante ao esbatido postal mental que dela tinha.
Esperava a opulência burocrática do centro do Império; mas esta tem apenas uma visibilidade residual em meia dezena de quarteirões, onde sedes bancárias e tribunais futuristas se espelham monotonamente uns aos outros.
Esperava também uma cidade multi-cultural - o velho cliché londrino; não esperava um bi-culturalismo nervoso, que me fizesse lembrar certos bairros de Birmingham.
Tivémos décadas para assimilar a ameaça de que o crescente impulso para a homogeneização económica e cultural faria com que todas as grandes capitais se parecessem umas com as outras, as diferenças lentamente erodidas pela presença ubíqua dos espectros de John Pemberton e Dick e Mac McDonald. Mas esta ameaça sempre teve concretização interna num certo tipo de "viajante" (palavra que deve ser sempre sequestrada entre aspas).
Pessoalmente, noto que cada lugar que visito é semelhante aos que visitei anteriormente, e é totalmente diferente daqueles onde nunca estive. O factor de ligação é, obviamente, a minha pessoa.
Disto resulta que um cartaz prometendo revelações sobre a vida sexual de Tintim, colado à porta de uma sapataria abandonada, me tenha feito lembrar Moscavide. Ou que uma mulher de meia-idade envergando um par de óculos amarelos absurdamente grandes e um par de sandálias amarelas absurdamente pequenas me tenha feito lembrar Cracóvia. Ou que um mulato esquelético empurrando uma máquina de Raios-x ao longo da linha do Eléctrico me tenha feito lembrar Glasgow (onde nem sequer há Eléctrico).
Cada cidade nova é um espelho adequado apenas dos bolsos traseiros das calças. Do direito, onde tenho os cartões de débito; e do esquerdo, onde guardo, no seu estado embriónico, o índice remissivo da desordem no interior da minha cabeça.

... E Sadi Carnot ri-se na escuridão do tùmulo



Mais cedo ou mais tarde, esteja onde estiver, qualquer ser humano acaba por se sentar e ligar a televisão.

sexta-feira, setembro 22, 2006

O lugar na estante

Duas pessoas, ambas de impecável e insuspeito gosto literário, discordaram cordialmente (uma por mail, outra em pessoa) de um efémero post que escrevi aqui há tempos sobre Don DeLillo. Impus a mim próprio uma reiteração qualificada. Eu continuo a achar DeLillo um grande escritor, tal como achava quando descobri os seus livros com assombro em 2000, na Bibioteca Pública de Birmingham. Os seus livros, precisamente, é que me parecem cada vez menores. E isto não um paradoxo de trazer por blog. Permitam-me um desvio.
Numa recolha de textos sobre os encontros entre Kasparov e a 1ª versão do Deep Blue em 1996, lembro-me de ter lido alguém, enamorado pela sua Espécie, que se gabava que qualquer Grande Mestre podia olhar para a notação da segunda partida e detectar imediatamente qual era a linha humana e qual a da máquina. Vale a pena realçar que a recolha agrupava autores cujo interesse pelo xadrês se assemelha ao meu: apaixonado, mas declaradamente leigo. (Xadresismo lowbrow, digamos). Alguém que conhece o jogo muito melhor do que eu ou o autor do referido texto garantiu-me recentemente que essa superstição já não tinha fundamento na altura e que vai sendo cada vez mais descabida; não porque as máquinas tenham evoluído e encurtado a distância (embora o tenham feito), mas porque o jogo humano - especialmente ao mais alto nível competitivo - permite cada vez menos espaço ao movimento ousado, à inovação radical, ao descuido genial.
Hipoteticamente, seria então possível, ao leitor batido e experimentado, detectar o dedo cibernético na literatura que, numa década lá para o meio do séc. XXI, fosse produzida por um Dark Deep Rainbow, autor de sonetos heróicos e romances espistolares, com © da IBM? Agrada-me, obviamente, pensar que sim. E a questão aqui não é de mera qualidade. Tenho dificuldade em admitir que um computador pudesse escrever Herzog, Pnin ou Mating, mas também o Valley of the Dolls, o Jaws ou o Sei Lá. O livro genuinamente mau, por muito formulaico que seja, tem de florescer de um impulso criativo também ele genuíno - a má Arte é quase sempre involuntária.
Mas custa-me menos a conceber que uma máquina pudesse ser programada para escrever como DeLillo.
Releio, para tirar teimas, algumas partes de Underworld que me ficaram na memória: os B-52's no deserto, os espantosos monólogos fictícios de Lenny Bruce, o episódio em que um padre Jesuíta força Nick a nomear as várias partes componentes de um sapato. Tudo isto permanece admirável. O que não existe, ou é raro, é o pulsar de uma consciência.
O meu sempre fiável James Wood (o melhor crítico contemporâneo em língua inglesa), numa das suas lúcidas diatribes contra o que ele chama "Realismo Histérico", alertou para o perigo de se usar a paranóia como elemento estruturante de uma narrativa - vício comum a uma geração inteira de escritores americanos operando sob a sombra monumental de Gravity's Rainbow. Delillo cai no alçapão que ele próprio cavou: ao insistir que tudo está interligado, força o leitor a constatar que nenhuma dessas ligações é ao nível humano.
Nos três contemporâneos de DeLillo que são, linha por linha, tão bons como ele - Roth, Pynchon e Norman Rush - esse pulsar está presente em cada página. Em DeLillo é apenas vapor, um vapor que ganha alguma solidez - a espaços - em White Noise, o mais doméstico dos seus romances, e na secção mais autobiográfica de Underworld, que trata da infância de Nick Shay no Bronx.
Mas um escritor capaz do desastre estético que é Cosmopolis (reafirmo: um dos piores romances que li nos últimos anos) tem forçosamente de ser reavaliado. E o resto da obra de DeLillo podia ter sido facilmente encapsulada em mini-ensaios; os artifícios específicos da ficção são, nele, quase sempre contingentes.
Por isso, apesar dos vários prodígios da sua escrita, na minha estante ele permanecerá entre o America de Baudrillard e os Derridas, não entre Bellow e Pynchon.

quinta-feira, setembro 21, 2006

Penitência

Espreito um dicionário gramatical na Bertrand e descubro uma coisa assombrosa: ando há anos a utilizar incorrectamente o advérbio demais nas situações em que devia usar a locução adverbial de mais. E isto sem nunca ninguém ter tido a gentileza de me corrigir. Como penitência, decidi escrever 100 vezes num caderninho: "De mais: locução adverbial que significa a) uma quantidade excessiva, b) além do devido ou necessário, c) muito. Demais: advérbio equivalente a além disso ou de resto."
Sugiro aos outros prevaricadores que façam o mesmo.

Hugo Chávez fala de Sadi Carnot às Nações Unidas

Ciganos da Ucrânia


Descobri-os em Junho, no programa do Jools Holland, mas só ontem comprei o cd. Está a 16.95 euros na Fnac. Acreditem: é uma pechincha.

Hoje fazem anos




Três amigos meus.

segunda-feira, setembro 18, 2006

"bent in/ By the blows of what happened to happen"

Nada do que me acontece é planeado.

Zapruder


Enfim, estou chateado. Em parte, porque não consigo decidir se o futebol português precisa de um Earl Warren ou de um Jim Garrison.

Ameaça

Um dia destes, atentem bem no que vos digo, eu passo-me da cabeça e escrevo um poema em pentâmetro iâmbico sobre um busto de Sadi Carnot (o da III República), cujos mármores se corroem em silêncio com o desgosto de nenhum cinzel os espatifar na forma de Sadi Carnot (o outro, o Anticristo).
Depois não digam que eu não avisei.

Hoje bloga-se de...


... Nono Círculo do Inferno. Cujos funcionários são todos sósias de Sadi Carnot.

quinta-feira, setembro 14, 2006

Messenger

«Olha, isto está a chegar aos 59 minutos, queres que fique mais meia-hora?»
«Ah... se me dissessem isso na cama...»

Poor little ego, how did you feel today?

Excertos dos diários de Susan Sontag aparecem hoje no The Guardian.

Post no qual o autor do blog revela uma fraqueza sentimental por pop oakeshottiano

Well I walked past just yesterday
And I couldn't bear that new mall no more
I can't expect you all to see it my way
But you may not know what was there before
And I want them to put back my old corner store

Well I walked past just like I say
And I felt this hurt that would not go home
I can't expect that you're gonna see it my way
But you may not know the trees I've known
And I want them to put back my old corner store

I know it costs more money to shop there
But this was love, this was love
I know you had to pay more money
I'll pay money, I'll pay more
I don't care what the mall has got
I want back that corner store

And what did I feel when I walked by slow
Sorrow sorrow, all around
Why I would feel sorrow I now know
I smell a ghost smell from the ground
That old wooden smell from the old corner store

Bam a nib a nib a nib way oh
Bam a nib a nib a way oh web oh
Bam a nib a nib a no Corner store Corner store
Bam a nib a nib a nib way oh
Bam a nib a nib a way oh web oh
Bam a nib a nib a no Corner store Corner store

I walked past one final time
And I wished the worst on the place I shop
Now I can't expect everyone to feel like I am
But I spot a trend that has got to stop
And I want them to put back that old corner store

Bam a nib a nib a nib way oh
Bam a nib a nib a way oh web oh
Bam a nib a nib a no Corner store Corner store
Bam a nib a nib a nib way oh
Bam a nib a nib a way oh web oh
Bam a nib a nib a no Corner store Corner store


(Jonathan Richman, «Corner Store», Jonathan Goes Country)

Post no qual o autor admite continuar a desobedecer às instruções do Almanaque Borda D'Água

No compacto Jay Leno, na Sic Comédia, alguém traduziu a expressão "I'm gonna pop a cap in your ass" como "Vou abrir uma garrafa no teu traseiro". O que me parece muito mais doloroso.

Hoje bloga-se de


Fórum Picoas, cujo funcionário percebe qualquer pergunta à primeira.

quarta-feira, setembro 13, 2006

O blog de Coleridge II (ou "A edição e revisão deste blog é da exclusiva responsabilidade dos leitores")


«If I should die without having destroyed this and other Memorandum Books, I trust, that these Hints and first Thoughts, often too cogitabilia rather than cogitata a me, may not be understood as my fixed opinions - but merely as the suggestions of the disquisition; & acts of obedience to the apostolic command of Try all things: hold fast that which is good.»

(S. T. Coleridge, Notebooks [June 1810])

Choque equestre

Infra-estruturas? Do que este país precisa é de uma boa pista para corridas de cavalos.

Fuck you David Hume

Mesmo debaixo de uma torrente de provas, ainda há quem tente desacreditar e ridicularizar a mais que óbvia relação de causalidade entre as minhas esporádicas visitas a Portugal e os bons resultados do Sporting. Estes literalistas da Lógica, para além de serem chatos, não percebem que, na anti-terra que é o Futebol, uma t-shirt esburacada, um cachecol encardido ou até um simples par de peúgas desirmanadas podem fazer ruir todos os edifícios da Razão.
Eu admito - e até compreendo - que as grinaldas e florilégios do sucesso recaiam sobre os Caneiras, os Bentos, os "miúdos", etc.
Não acreditem: a responsabilidade é minha, e da minha roupa suja.

Futebol total


O médio-ofensivo recupera bolas; Miguel Veloso, o "trinco", distribui e dribla.
O lateral-direito remata à baliza; Liedson desarma um adversário perto da linha de fundo.
Os 2 avançados fazem o maior número de faltas; o golo é marcado por um defesa.
Até alguém me mandar calar, vou passar a referir-me a esta equipa como o "Limão Mecânico".

Manual de Sobrevivência

O artigo "Manual de Sobrevivência" do Almanaque Borda D'Água para 2007 inclui a seguinte frase: «Veja menos televisão, que frequentemente estupidifica e deprime, e antes converse, leia, escreva, pinte, faça desporto, medite, reze...»
Obedecerei a esta sensata instrução assim que conseguir decifrar a natureza exacta da relação entre a Floribella e o Frederico.

Hoja bloga-se de

Fórum do Seixal, cujos funcionários são adequadamente prestáveis.

segunda-feira, setembro 11, 2006

Impressões de chegada

Gostaria de falar do "caso Mateus"; da reforma da Segurança Social; do novo formato do Expresso.
Mas vou antes dizer isto: o Plateau passa música muito boa.

9/11

Estava - como em tantos outros momentos, históricos ou não - num alfarrabista. Em Birmingham. Três ou quatro clientes receberam mensagens de texto quase simultaneamente e o gerente ligou um rádio.
Pensei imediatamente na única pessoa de New York que conhecia: um tipo chamado Keith, que tinha conhecido na semana anterior numa pousada em Londres, e que se apresentava a toda a gente da mesma maneira:
"Hi, I'm Keith. I'm from New York City."
Foi o Keith que me falou pela primeira vez dos White Stripes, na altura ainda meio desconhecidos na Europa. E na noite de 9 para 10 de Setembro, a última que passámos em Londres, deu-me uma palestra de duas horas (com dezenas de exemplos ilustrativos) sobre sotaques americanos, depois de eu ter cometido o erro de falar de "um sotaque americano". É que há muitos. E ele falou-me de todos.
Na manhã seguinte apanhei um comboio para Birmingham e o Keith apanhou um avião para La Guardia e não voltámos a falar, porque são mesmo assim as amizades de viagem.
O Keith, que era de New York City, e que, durante poucas semanas, teve centenas de milhões de conterrâneos, todos com "sotaque americano".

Hoje bloga-se de...


...Alcácer do Sal. Cuja Junta de Freguesia tem um ponto Net com funcionários excessivamente simpáticos.

sexta-feira, setembro 08, 2006

O blog de Coleridge


«What a beautiful Thing Urine is, in a Pot, brown yellow, transpicuous, the Image, diamond shaped of the Candle in it, especially, as it now appeared, I having emptied the Snuffers into it, & the Snuff floating about, & painting all-shaped Shadows on the Bottom.»

(Samuel Taylor Coleridge, Notebooks - December 1803)

Na Escócia é que sabem


Sai para a semana. Devotos Peeleanos, fãs de Undertones, amantes da boa punkalhada britânica: comprem e divirtam-se.

Playlist

O meu PC também tem a sua polícia secreta, e mantém-me sob cerrada vigilância musical. De acordo com as pidescas estatísticas do Windows Media Player, estas são as 10 canções que mais vezes ouvi em repeat nos últimos 2 anos:

1. «Some Kinda Love», Velvet Underground
2. «Just Like Tom Thumb's Blues», Bob Dylan
3. «Love Letter», Nick Cave
4. «Our Way to Fall», Yo La Tengo
5. «Bugger Bognor», Luke Haines
6. «Danny Says», Ramones
7. «Tesla's Hotel Room», The Handsome Family
8. «Pushkin», Will Oldham
9. «RV», Faith No More
10. «Come Back to Camden», Morrissey

(Em 11º lugar está o «Ace of Spades» dos Motörhead, o meu amuleto mp3 para as noites de poker virtual)

Publicidade

Gosto muito, mesmo muito, de um grupo musical canadiano que nenhum dos meus leitores conhece. E é assim que eu quero que as coisas se mantenham.

Housekeeping

Antes das férias, arruma-se a casa. A lista de links foi remodelada. Inclui agora mais quatro blogs descobertos às três tabelas; mais alguns escritores "da casa"; uma página com gatinhos bébés; e uma agência de apostas. Há pornografia lituana, mas está camuflada; os eventuais interessados terão de ler muita coisinha edificante antes de acharem a pocilga.
O nome, o lema e o layout do blog continuam na mesma, mas desconfio que não por muito tempo. Até o nome do autor pode mudar em breve. Ser o Rogério Casanova, mesmo em part-time, não é, de todo, o que a publicidade prometia.

Interregno

O ritmo de postagem vai ser drasticamente reduzido nas próximas três semanas.
A culpa é de Lisboa.

quinta-feira, setembro 07, 2006

Caveat Senescens

Ele escreveu: "o tempo não se limita a passar; muitas vezes passa-te por cima".
Depois escreveu: "esse rosto apedrejado por cronologias".
E ainda arranjou tempo para escrever: "vivo, morto, vegetal, qual é a diferença?".
Por fim decidiu rasgar o postal de aniversário e começar de novo quando se sentisse menos ruvinhoso.

Elementos de Frenologia



« ... as quase imperceptíveis protuberâncias no cocuruto de Liv Tyler comprovam que ela é muito boa rapariga, amiga do seu amigo, e dada à paródia ... »

(Franz Joseph Gall, A Anatomia e Fisiologia do Sistema Nervoso em Geral, e do Cérebro em Particular, Apêndice VII)

Abóboras

Num bloco de notas da minha adolescência encontro uma página preenchida por uma citação do Humboldt's Gift em que o narrador Charlie Citrine se refere a outro personagem como um "cabeça de abóbora". Na página seguinte está uma lista de batotas para o Fifa '98 - que inclui um código para transformar as cabeças dos jogadores em abóboras gigantes.
Até à deriva na frivolidade eu gosto de uma certa consistência temática.

Hipérboles minimalistas

Prefiro um ensaio menor de James Wood aos melhores livros de George Steiner.
Prefiro dois minutos dos Ramones à discografia completa dos The Clash.
Prefiro um conto de Chekhov à obra inteira de Flaubert.

Tratamento preferencial

Por um daqueles groundhogdayescos desacertos cósmicos, acordei dois dias seguidos ao som da mesma canção - uma popalhada banal dos The Feeling. Passado o pânico inicial, uma linha chamou-me a atenção:

People in love get special treatment

O que é manifestamente mentira. Não têm. Mas deveriam ter. Pelo menos nas farmácias e supermercados.

quarta-feira, setembro 06, 2006

... his sanity an unstable artifice...


« ... He woke up with a shudder as though he had himself fallen off his bicycle. If his mind were really this sort of magnet, mechanically dispersing its lines of force when it went to sleep, and mechanically orienting them when it woke up -- which was normal, the dispersion or orientation? The mind, like the body, kept its unity unless it happened to lose balance, but the professor of physics, who slipped on a pavement and hurt himself, knew no more than an idiot what knocked him down, though he did know -- what the idiot could hardly do -- that his normal condition was idiocy, or want of balance, and that his sanity an unstable artifice. His normal thought was dispersion, sleep, dream, inconsequence; the simultaneous action of different thought-centres without central control. His artificial balance was acquired habit. He was an acrobat, with a dwarf on his back, crossing a chasm on a slack-rope, and commonly breaking his neck.»

(The Education of Henry Adams)

O citador incorrecto

"I'm gonna get medieval on your mind"

Conversa de pub

(Dois trintões sisudos trocavam reminiscências...)

--Gostava de poder voltar à escola, com a idade que tinha na altura, mas sabendo tudo aquilo que sei hoje.
--A ideia não é má; o problema é que eu, por exemplo, sei menos hoje do que sabia quando entrei para a Preparatória.

Odd man out

O Robert, meu flatmate em Edimburgo durante um ano e meio, fez anos ontem. No mesmo dia em que nasceram Freddie Mercury, Arthur Koestler, Jesse James. E também aquele que é o meu pintor Romântico preferido: Caspar David Friedrich.
Curiosamente, deste quinteto heterogéneo, o Robert não é o odd one out.

Airport Security Oversights

Airport Security Oversights
September 6, 2006


A Connecticut man was recently arrested for carrying a stick of dynamite in his checked luggage on a flight back from Brazil. Here are some other items that have passed through airport security recently:

July 24, Houston to New York: Unauthorized liquids, cleverly hidden within cell membranes of passenger
July 28, Portland, OR to Topeka, KS: 16 pounds of science textbooks
Aug. 15, Pittsburgh to Detroit: VHS tape of Nothing But Trouble, starring Chevy Chase and Dan Aykroyd
Aug. 19, Washington, DC to Darfur: Hope
Aug. 23, Bangkok, Thailand to Orlando, FL: Monkey's paw with one wish left
Aug. 29, São Paulo, Brazil to Hartford, CT: More mining equipment, including Komatsu PC400LC-7 deep excavator
Aug. 31, Sydney, Australia to Los Angeles: Russell Crowe
Sept. 3, London to New York: A few Muslim people may have slipped through with their dignity

(The Onion)

terça-feira, setembro 05, 2006

Código da estrada - King James Version

Mercury Prize

O vencedor é anunciado daqui a uma hora. Fazendo fé nos melhores indicadores de intenções da Grã-Bretanha (as agências de apostas) os Arctic Monkeys serão os galardoados de 2006. E justamente, embora eu tenha atribuído, a título particular, uma sentimental menção honrosa ao álbum de duetos da Isobel Campbell e do Mark Lanegan (especialmente pela faixa "The False Husband", que é soberba).
Os juízes do Mercury têm, contudo, um longo cadastro de decisões injustificáveis, das quais se redimiram parcialmente nos dois últimos anos. Mas há quem tenha deixado de levar o prémio a sério em 1997, quando o Ok Computer foi considerado menos brilhante que um álbum do Roni Size. Tão ou mais grave, na minha opinião foi terem preferido o Bring it On dos Gomez ao Mezzanine dos Massive Attack, ou terem premiado em 2002 um banalíssimo naipe de clichés hip-hop - Ms Dynamite - em detrimento do melhor álbum a saír de Liverpool desde Ocean Rain - o homónimo álbum de estreia dos excelentes The Coral.
Este ano, as possibilidades de espalhanço são reduzidas. O prémio não ficaria mal a nenhum dos cinco álbuns nomeados que conheço (Monkeys, Campbell/Lanegan, Gillemots, Hot Chip e Thom Yorke) e até os Muse - nos quais não vejo nem ouço nada de especial - editaram o que dizem ser o seu melhor disco.
Às 21 horas saberemos. Mas, parafraseando Darwin, o dinheiro inteligente está mesmo nos macacos.

Alvo fácil

Na secção musical de um diário online português leio uma referência a um "conserto" dos Rolling Stones. Os pobres dinossauros começam a ser um alvo cómico demasiado fácil.

Ementa

«Sanduíche de Britney Spears em leilão»

(PortugalDiário.iol.pt)

A pergunta que se impõe é: o pão é branco ou integral?

segunda-feira, setembro 04, 2006

Hurt


Trent Reznor. Johnny Cash. Ouvir sem moderação.

Leitura obrigatória

April March, Herbert Quain
Romanticism and Christianity, Moses Herzog
Beltraffio, Mark Ambient
The Grasshopper Lies Heavy, Hawthorne Abendsen
The Protocols of the Elders of Tralfamadore, Kilgore Trout
Night Rote, John Shade
The Courier's Tragedy, Richard Wharfinger
The Theory and Practice of Oligarchical Collectivism, Emmanuel Goldstein

Na minha rua não há mulheres assim (III)


Claire Forlani, actriz inglesa

Junta-te ao clube, compra a t-shirt

«Representar não é muito difícil. As coisas mais importantes são saber rir e chorar. Se quero rir, penso na minha vida sexual. Se quero chorar, penso na minha vida sexual.»

(Glenda Jackson, vencedora de dois Óscares e actual membro do parlamento britânico)

sábado, setembro 02, 2006

Fallen Majesty


... this hand alone,
Like some last courtier at a gypsy camping-place
Babbling of fallen majesty, records what's gone.

(W. B. Yeats)

Aniversário


Joseph Roth, nascido a 2 de Setembro de 1894, autor de um dos melhores romances da literatura moderna: A Marcha de Radetzky, um longo epicédio à Casa de Habsburgo.

Das botas de feltro


«O Marxismo pode responder à seguinte pergunta: porque é que o muzhik há-de acreditar nos espíritos, enquanto usar botas de feltro? As botas de feltro definem o modo camponês de produção; por, sua vez, este último provoca uma série de fenômenos estreitamente ligados à botas de feltro – um horizonte limitado, uma dependência de escravo face à chuva, ao sol e outros fenómenos naturais elementares que, em conjunto, criam as superstições do camponês. O marxismo pode tentar explicar tudo isso. Mas poderá o marxismo ensinar como se fazem botas de feltro? Não, não pode. Pode explicar porque é que o muzhik usa botas de feltro – porque em sua volta há apenas floresta, a lama e a pobreza – mas não é possível coser botas de feltro segundo o método marxista!»

(Leon Trotsky, Saber Militar e Marxismo)

sexta-feira, setembro 01, 2006

O livro dentro do livro


Tenho passado os últimos dias a ler - aos repelões, e com o restolhar constante da hesitação - a monumental 'Vida' de Chekhov, por Donald Rayfield. Percebi, ao fim de poucas páginas, que não é o tipo de biografia que prefiro. Rayfield, aliás, define os seus termos no Prefácio quando escreve que "biografia não é crítica literária"; e dedica as 674 páginas seguintes a ilustrar esta proposição. Os contos e as peças são referidos apenas tangencialmente e, na maioria dos casos, apenas como suporte à velha party-piece da biografia de autores: o nebuloso processo pelo qual a experiência é transformada em arte.
Sempre gostei mais de ler o auto-exame de um escritor, por muito rarefeito que seja o oxigénio da verdade; o défice factual costuma ser compensado pela abundância de talento. Estou a pensar, claro, na Educação de Henry Adams (cuja edição anotada dedica muitas linhas a corrigir erros do autor: "Adams misremembers the date...", "Adams is wrong about this..."). Mas também noutras autobiografias, que se podem ler e reler pelo puro deleite estético que proporcionam, libertas do espartilho da ordenação dos factos: a Biographia Literaria de Coleridge, o Persons and Places de Santayana, o Experience de Martin Amis.
Dentro do cárcere genérico que escolheu, contudo, Rayfield faz um trabalho notável. Não se limita à leitura obstinada das mais de cinco mil cartas de Chekhov (em 31 volumes) - arranja ainda tempo para lamentar as dezenas de parágrafos truncados pelos editores, bem como algumas passagens riscadas pelos destinatários. Lê também, com resultados hilariantes, grande parte das receitas médicas que o doutor Chekhov passou. E até alguns exames do estudante Chekhov, na faculdade de Medicina (embora tenha experimentado "dificuldades de acesso" aos exercícios de aula, admite resignadamente). Lá para o vigésimo capítulo o leitor recusa sequer contemplar a possibilidade de algum incidente relevante na vida de Chekhov ter escapado ao escrutínio opressivo do biógrafo-detective.
Num sentido, pelo menos, o livro de Rayfield é um triunfo. O Chekhov que ele exuma (vital, pândego, generoso, atormentado, deliciosamente humano) é muito mais apelativo que o Chekhov mitológico dos anteriores esforços biográficos, encapsulado na célebre frase de Dovlatov: "Podemo-nos sentir assombrados pela mente de Tolstoi, maravilhados com a elegância de Pushkin. Apreciar a demanda moral de Dostoievski, o humor de Gogol. E por aí fora. Chekhov, contudo, é o único homem a quem gostaríamos de nos assemelhar." Ao tentar erigir um anti-mito, Rayfield acaba por (inadvertidamente) esculpir apenas um pedestal diferente.


Mas dentro destas 674 páginas inchadas com factos, nomes e datas, há uma dieta superior a querer sair: um manual de sedução. Alguns exemplos, mais ou menos ao acaso:
. na página 212, o herói "inicia um affair com Kleopatra Karatygina; leva-a a ver Les Huguenots e receita-lhe laxantes";
. oitenta páginas depois, o herói rebola-se alegremente num quarto de hotel com duas actrizes moscovitas, uma delas de 19 anos, no mesmo dia em que escreve, numa carta ao seu amigo e editor Suvorin, que "todos os pensadores são sexualmente impotentes quando chegam aos 40 anos". (Chekhov tinha 33);
. na página 337, a filha de Tolstoi confessa pensamentos pecaminosos sobre o herói, depois de um único - e brevíssimo - encontro;
. alguns meses depois, a lasciva Lidia (outra actriz - um elemento recorrente) escreve a seguinte nota ao herói: "Vem imediatamente, Antosha! Estou em desespero. Vem, querido. E não há salada. Encomenda alguma. Beijo-te com força, Lidia." (Rayfield abstém-se decorosamente de comentar a necessidade de salada).
Proponho como epígrafe a este livro inexistente uma passagem do célebre bloco de notas de Chekhov, o caderninho onde ele apontava ideias para contos, manchetes de jornais locais ou observações aleatórias, como esta:
"Se queres ser amado pelas mulheres, sê original; conheço um homem que usava sempre botas de feltro, no Verão ou no Inverno, e as mulheres apaixonavam-se constantemente por ele."

Na selva

Há dias em que penso que também eu perdi a minha oportunidade com a May Bartram.

Deísmo desenhado


Durante muito tempo (dos 3 aos 9 anos, para ser preciso) modelei a minha imagem de Deus no druida Panoramix.

Dogma

Há verdades tão incontestáveis que vale a pena repeti-las sempre que possível: o 4-4-2 em losango é o melhor sistema táctico.
O 4-4-2 em losango é o melhor sistema táctico.

Guilty Pleasures

W. Somerset Maugham

Queen, fase anos 80

Ferris Bueller's Day Off

La Famiglia

A minha prima tem um blog. A publicidade não é feita por ela ser de família, mas por ser adepta da "Família".